Blog: Não acreditarás se te disser como me tenho presente essa primeira noite.
Continuando!…
Continuando!…
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Fiquei, na minha humilde e simplória
narrativa, no início da noite desse
inaudito dia de Verão dos anos oitenta, de cujo sucesso, evolução e implicações
na minha vida, me propôs, aqui, fazer uma íntegra e fidedigna
exposição.
Comprometo-me a ser fiel aos factos e
verídico em tudo o que narrar. Pecarei, estou certo, por inabilidade e
incapacidade de verter nesta prosa, de forma suficientemente clara e profunda,
quer as minhas sensações, quer a descrição dos acontecimentos. Abreviando: sou
um palerma sem jeito para as letras, com poucas capacidades e habilidades, mas
sou (e tudo farei para ser sempre) honesto e rigoroso.
...
Caiu a noite, nesse dia de Junho, e eu
recolhi ao meu cantinho privativo – o meu quarto.
Possuído de um estranho misantropismo, embora quase houvesse esquecido tudo o que se passou, apetecia-me estar só.
Nesse dia não liguei a televisão. Pelo
contrário, fui acometido de uma vontade imensa de ouvir música em ambiente
escuro. De luz apagada, auscultadores a tapar a totalidade do pavilhão
auricular, fiquei tempo sem fim a degustar músicas calmas, ora eruditos temas
clássicos, ora músicas românticas.
Adormeci a escutar o “28 degrés à
l'ombre” de Jean-François Maurice.
Tão rápido embalei no sono como comecei a
sonhar com aquela graciosa, ímpar, arrepiantemente divinal e enérgica figura,
com a qual havia sofrido um choque, na tarde desse dia.
Nos meus sonhos eu via, com uma precisão
geométrica, aquela excepcional figura. Em simultâneo, eu revivia a sensação que
me havia imobilizado nessa tarde. Ficava-me no peito um estranho sentimento,
misto de espanto e encanto, de fascínio e nostalgia, de dor e alegria, de
prazer e tristeza.
Esta situação repetiu-se várias vezes, a
ponto de me deixar uma estranha dor no peito – uma dor corpórea que me espantou
o sono.
Incapaz de dormir, não sei se sonhava ou
se meditava, mas, invariavelmente, o tema era o mesmo – aquela miúda que me
deixou estático, na “avenida” da urbe sede do meu concelho, onde, nesse dia eu
fora, como tantos outros dias, ao encontro da minha turma.
Comecei, entretanto, a discorrer de forma
mais lógica. Formulava questões e tentava encontrar a resposta.
Por que razão vivenciei tão estranha
sensação?
Ainda hoje, tantos anos depois,
questiono-me se alguém terá vivido igual acontecimento. Desconheço a resposta.
Quem seria ela? Qual seria o seu nome?
Qual seria a sua idade?
Para estas questões eu não tinha resposta.
Nem sequer me atrevia a formular suposições, a não ser o facto de achar que ela
seria da minha idade – pura intuição.
De onde seria? Porque razão nunca a tinha
visto antes?
Bom, ela não frequentava a minha escola.
Disso tinha absoluta certeza!
A minha escola era, nessa época, a única
do concelho. Também não era provável que ela, sendo do meu concelho, estudasse
noutra escola, sendo certo que a minha escola captava alunos dos concelhos
vizinhos e não havia notícia do contrário.
Restavam algumas alternativas.
Primeira: ela podia não ser estudante.
Nesse tempo a escolaridade obrigatória quedava-se pelo sexto ano de
escolaridade (felizmente).
Segunda: ela podia estar no estrangeiro,
ser filha de pais emigrantes. Isso explicaria, racionalmente, o facto de nunca
a ter visto… afinal era tempo dos emigrantes regressarem de férias. Fazia
sentido, mas ficava, igualmente, sem resposta para as questões mais importantes:
Quem era? Como se chamava?
Ora sem sono, ora fazendo um esforço
titânico para não adormecer, assim passei a noite.
Num misto de cansaço, de estranho
sofrimento e de desilusão, acabei por imputar a mim próprio a responsabilidade
por este meu estado.
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…/…
Não é um palerma com pouco jeito para as letras, nem tem poucas capacidades. Então eu que não dou nada para línguas o que seria? Nem penso nisso, faço o que posso e não acho que o faça totalmente mal. O mesmo deveria acontecer aqui por este lado.
ResponderEliminarAcho que um dos problemas está em ter dirigido a si próprio todo o conflito porque estava a passar. Deixo-lhe uma questão que não é para me responder, mas somente para colocar a si próprio. Porque razão imputou a si toda a responsabilidade?
A pergunta pode ser descabida, uma vez que não sei a continuidade e os contornos mas deixo-a mesmo assim.
Pois, permita-me confessar, sem qualquer favor ou hipocrisia, que gosto imenso da sua escrita.
ResponderEliminarBom, se tiver paciência e abnegação suficiente para acompanhar a minha "redacção", perceberá...