segunda-feira, 29 de junho de 2020

A boa nova!... (Vidi lumen regenerati spes mihi).

Meu caro blog: perdoa-me falar deste amigo - o Xico - que não vejo há tantos anos! Soube, há pouco, que ele vive em Dusseldorf. Mantenho aqui o seu nome real e peço a Deus que lhe dê tudo de bom. 


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Aquele grupinho de aventura, ao qual eu pertencia, não era um gang. Era um grupinho de amigos, responsáveis, bem-intencionados e que se esforçavam por manter as suas malandrices dentro dos limites da polidez, urbanidade e educação, pese embora, uma ou outra vez, as simples brincadeiras que fazíamos tivessem resultados infelizes.

Apesar disso, a minha família não via com bons olhos a integração nesse grupinho, mais em razão dos interesses divergentes dos seus membros e da pouca propensão para a cultura, do que das suas acções – eram maus exemplos em termos académicos e em termos de interesses, mas “boa gente”. Contudo, como eu sempre fui bom aluno, com um comportamento quase imaculado e mantinha uma estreita ligação com a cultura e as artes, sempre gozei de uma moratória que distendia até bem longe a minha liberdade.

Um dos membros desse grupinho era um jovem de compleição franzina, muito moreno, extremamente ágil e com uma história de vida tão longa quanto tortuosa.

Foi criado, desde muito tenra idade, por uma tia-avó. A sua progenitora, mãe solteira, com mais dois filhos (mais velhos), abandonou o petiz aos cuidados da tia. Vivia a cerca de um quilómetro da minha casa e fomos bons companheiros de infância. Quando chegou a idade de ingresso na escola, a tia-avó conseguiu que o petiz fosse admitido na “Oficina de S. José”, onde permaneceu, apenas em tempo de aulas, até completar a quarta classe. Obtido o diploma desse grau académico, abandonou a instituição e regressou à companhia de “velhota”. Por ali foi sobrevivendo, entre a casa da tia-avó e a dos vizinhos. Entretanto foi arranjando algumas ocupações, nunca de grande duração mas onde, pelo menos, tinha alimentação, eventualmente tinha também dormida e ganhava para os “gastos”. Chamava-se Francisco – era, simplesmente, o Xico.

À data dos factos em que estava sincronizada a cronologia da minha narrativa, já havia falecido a tia-avó do Xico. A sua progenitora regressara, agora com um novo companheiro e mais dois irmãos, ainda muito pequeninos. Nessa altura o Xico trabalhava numa padaria. Trabalhava de noite e, a maior parte das vezes, pouco dormia de dia. Tinha, no entanto, uma resistência incrível e uma energia que ensombrava a fama das pilhas “Duracel”.

De vez em quando, o Xico gabava-se de ter “engatado” uma miúda, pelo que, durante um ou dois fins-de-semana não apareceria “ao toque de reunir” para a formatura do grupinho.

Naquele domingo, dia de vinte e oito de Junho, desse ano de aventuras (de 198x), o ponto de encontro do grupinho era num café que actualmente já não existe (conhecido como Café Galocha ou Café do Pistolão – denominação herdada da alcunha do proprietário).

Quando o Xico chegou já eu e os restantes membros do grupinho estávamos a postos. Saciada a sede e actualizadas as novidades, eu estava demasiado calado, a ponto de ouvir o Xico dizer: «Tu nem falas… viste alguma assombração ou estás tolhido pelo calor?»

Fui sincero: - «Acho que vi uma assombração!…»

E desatei a contar a inopinada e quase celestial visão. 

Tão concreto, rigoroso e expressivo fui na minha descrição que, ainda eu não tinha acabado de narrar o sucedido, já o Xico afirmava, de forma categórica e indubitável: «Éh pá!… Eu conheço muito bem essa miúda!...».

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domingo, 28 de junho de 2020

O despertar e a mudança...

Caro Blog, reafirmo: move-me aqui o sentido de ser rigoroso e fiel na narrativa e nada preocupado com questões de riqueza, estética ou qualidade literária.

... Continuando ...

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Fiquei, na minha paupérrima exp
osição (isto parece uma redacção da escola primária) no final da noite desse assombroso dia de Verão e... citando o Livro dos Genesis: “Sobreveio a tarde e depois a manhã: foi o primeiro dia.”

Vencido pelo cansaço, acabei por adormecer já perto do romper da aurora.

Despertei, poucas horas volvidas, na manhã seguinte (- era o segundo dia -), com uma sensação estranhíssima de pequenez e inferioridade. Eu era o ente mais desprezível, inútil, rude, ignaro e miserável do universo. Em abono da verdade, creio que desse depreciativo julgamento e dessa medíocre impressão jamais me separei, ou seja, ainda hoje, quando me auto-avalio, não vou muito além dessa classificação (mas esse assunto não é aqui chamado à colação).

Mal despertei, retomei o meu raciocínio lógico (se algo pode existir de lógico que possa ser invocado em toda esta história) sobre a quase-celestial figura. Fiquei-me, depois de acordar, por uma terceira hipótese: a miúda podia estar de passagem, podia viver longe… quiçá fosse um mero golpe do acaso o facto de ela ter passado pela minha terra!

Penitenciava-me pelo delito imperdoável de nada saber sobre ela. Afinal a culpa era exclusivamente minha: eu podia ter reagido de outra forma; talvez segui-la… ou então, porque não, arranjar uma desculpa para falar com ela.

Sempre assumi, com frontalidade e responsabilidade, as minhas culpas e fraquezas. Aqui não seria diferente, por muito que isso magoasse.

Nesse mesmo dia mudei, integralmente, todos os meus hábitos e rotinas. Não voltei a reunir-me com a minha turma.

Até ao final da semana fichei-me em casa.

Foram uns dias difíceis. O meu cérebro estava permanentemente ocupado com este assunto, partilhando o tempo de processamento entre a minha culpa, a análise de uma breve sequência de imagens que eu podia dissecar, fotograma a fotograma, e a triste condenação da certeza de jamais voltar a ver aquela inebriante figura.

Neste lastimável estado permaneci até ao fim-de semana.

Para além da minha turma eu tinha um grupinho de amigo, muito restrito, muito cúmplice e solidamente unido.

Esse grupinho era constituído por quatro membros, direi melhor, éramos quatro subidos heróis de inauditas proezas e aventuras. Amigos desde criança – “filhos de mesma geração e da mesma sorte”, como nós usávamos dizer.

 Destes, só eu estudava. Os restantes haviam deixado a escola. Um ficou-se pela quarta classe; outro, nunca ligara nada à instrução e cumpriu “recrutamento obrigatório” do ensino mais vezes em caso do que na escola, quase não sabia escrever, lia soletreando e com uma fonética tão arrevesada que parecia estrangeiro; o terceiro, que era o mais malandro do grupinho, ficou pelo sexto ano de escolaridade. 

Este grupinho de aventuras, do qual preservo as melhores recordações e uma infinda saudade, apenas reunia (ordinariamente) ao fim-de-semana ou, de forma ad-hoc, quer em ocasiões festivas, quer para aventuras e malandrices.

Por vezes um dos elementos do grupo tresmalhava-se. Se partia de férias, se saía para casa de familiares, se tinha algum tipo de outra actividade que lhe ocupasse o fim-de-semana, faltava à chamada por um período de tempo razoável, sem prejuízo de manter todos os compromissos para “acções ad-hoc”, sempre que fosse “requisitado”.  

 Surpreendentemente, e contra todas as probabilidades, foi neste grupinho que se fez luz sobre aquela misteriosa e quase-divinal figura.

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sábado, 27 de junho de 2020

Aquela infindável primeira noite "contigo"...

Blog: Não acreditarás se te disser como me tenho presente essa primeira noite.  
Continuando!…

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Fiquei, na minha humilde e simplória narrativa, no início da  noite desse inaudito dia de Verão dos anos oitenta, de cujo sucesso, evolução e implicações na minha vida, me propôs, aqui,  fazer uma íntegra e fidedigna exposição. 

Comprometo-me a ser fiel aos factos e verídico em tudo o que narrar. Pecarei, estou certo, por inabilidade e incapacidade de verter nesta prosa, de forma suficientemente clara e profunda, quer as minhas sensações, quer a descrição dos acontecimentos. Abreviando: sou um palerma sem jeito para as letras, com poucas capacidades e habilidades, mas sou (e tudo farei para ser sempre) honesto e rigoroso.
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Caiu a noite, nesse dia de Junho, e eu recolhi ao meu cantinho privativo – o meu quarto. 
Possuído de um estranho misantropismo, embora quase houvesse esquecido tudo o que se passou, apetecia-me estar só. 

Nesse dia não liguei a televisão. Pelo contrário, fui acometido de uma vontade imensa de ouvir música em ambiente escuro. De luz apagada, auscultadores a tapar a totalidade do pavilhão auricular, fiquei tempo sem fim a degustar músicas calmas, ora eruditos temas clássicos, ora músicas românticas.

Adormeci a escutar o “28 degrés à l'ombre” de Jean-François Maurice.

Tão rápido embalei no sono como comecei a sonhar com aquela graciosa, ímpar, arrepiantemente divinal e enérgica figura, com a qual havia sofrido um choque, na tarde desse dia.  
Nos meus sonhos eu via, com uma precisão geométrica, aquela excepcional figura. Em simultâneo, eu revivia a sensação que me havia imobilizado nessa tarde. Ficava-me no peito um estranho sentimento, misto de espanto e encanto, de fascínio e nostalgia, de dor e alegria, de prazer e tristeza.

Esta situação repetiu-se várias vezes, a ponto de me deixar uma estranha dor no peito – uma dor corpórea que me espantou o sono.

Incapaz de dormir, não sei se sonhava ou se meditava, mas, invariavelmente, o tema era o mesmo – aquela miúda que me deixou estático, na “avenida” da urbe sede do meu concelho, onde, nesse dia eu fora, como tantos outros dias, ao encontro da minha turma.

Comecei, entretanto, a discorrer de forma mais lógica. Formulava questões e tentava encontrar a resposta.

Por que razão vivenciei tão estranha sensação?

Ainda hoje, tantos anos depois, questiono-me se alguém terá vivido igual acontecimento. Desconheço a resposta.

Quem seria ela? Qual seria o seu nome? Qual seria a sua idade?

Para estas questões eu não tinha resposta. Nem sequer me atrevia a formular suposições, a não ser o facto de achar que ela seria da minha idade – pura intuição.  

De onde seria? Porque razão nunca a tinha visto antes?

Bom, ela não frequentava a minha escola. Disso tinha absoluta certeza!

A minha escola era, nessa época, a única do concelho. Também não era provável que ela, sendo do meu concelho, estudasse noutra escola, sendo certo que a minha escola captava alunos dos concelhos vizinhos e não havia notícia do contrário.

Restavam algumas alternativas.

Primeira: ela podia não ser estudante. Nesse tempo a escolaridade obrigatória quedava-se pelo sexto ano de escolaridade (felizmente).

Segunda: ela podia estar no estrangeiro, ser filha de pais emigrantes. Isso explicaria, racionalmente, o facto de nunca a ter visto… afinal era tempo dos emigrantes regressarem de férias. Fazia sentido, mas ficava, igualmente, sem resposta para as questões mais importantes: Quem era? Como se chamava?

Ora sem sono, ora fazendo um esforço titânico para não adormecer, assim passei a noite.

Num misto de cansaço, de estranho sofrimento e de desilusão, acabei por imputar a mim próprio a responsabilidade por este meu estado.
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terça-feira, 23 de junho de 2020

Naquele primeiro dia...

Blog: Continuando…

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Ia eu a dizer que a história podia e devia ter terminado naquela tarde de verão que eu narrava no início. 
Isso mesmo, por via de regra, usava acontecer comigo. 
Desta vez, contudo, o desenvolvimento foi muito diverso.

Nessa tarde, depois daquela breve mas enérgica aparição, segui ao encontro da minha turma. Todavia, de forma inusitada e brusca, nessa fatídica tarde, para mim, tudo se tornou diferente. Os acordes da viola do João perderam a harmonia, faltava humor às piadas da Manuela, a companhia da sedutora Elisabete tornou-se uma penitência e não um prazer … nada tinha sentido.

Subitamente, eu via com outros olhos o mundo que me rodeava  e, se me perguntassem porquê, nem eu mesmo sabia explicar o que se passava. Não havia motivo, não tinha justificação.

Ao contrário do que costumava acontecer, fui o primeiro a debandar do grupinho.

Recordo-me da reacção da Elisabete, com um ar de desdém: “Já vais!?... Que Deus te guie… e escreve para mandar saudades!

Regressei a casa sozinho, sem vontade de falar com ninguém, com a sensação de que o mundo não presta nem tem nada de proveitoso. Sentia-me abatido, melancólico e pesaroso, como se tivesse sido vítima de algo grave ou acometido de algum desgosto, mas não encontrava nenhuma razão objectiva para tão constrangedora e debilitante sensação.

Curiosamente, até ao cair da noite a miúda do “profético encontro “ não ocupava espaço de relevo na minha memória. Quase havia esquecido aquela inusitada aparição e a extraordinária sensação que me flagelou. 

Quando caiu a noite, com a entrada no recolhimento eremita do aconchego solitário do meu quarto, deu-se um fenómeno estranho – aquela “visão” ganhou vida.
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segunda-feira, 22 de junho de 2020

Tudo começou assim - o choque...

[Caro blog: assim começa a minha história...]

As histórias usam começar pelo chavão: “Era uma vez…”
Eu, como sou anormal, quase-demente, excêntrico q.b., mas senhor do meu nariz e, como estou a narrar factos e não a escrever uma peça literária, começo de forma distinta:




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No dia vinte e dois de Junho de mil novecentos e oitenta e --- (inícios dos anos oitenta), eram umas cinco horas da tarde dessa segunda-feira de Verão sufocante, este insano, então jovem adolescente, havia combinado encontrar-se com os colegas de turma.

A minha terra está acomodada junto a um rio, lendário e encantador, que aparece cartografado nos mapas deste rectângulo Luso. Era junto a esse rio, com a estival temperatura moderada pela humidade fluvial e resguardados na comodidade da sombra das árvores da avenida que estava marcado o nosso “ponto de encontro”.

Nesse dia atrasei-me incomensuravelmente.
Demorei-me a ajudar uma pessoa que necessitava do meu apoio e, para um encontro marcado para as duas horas da tarde, excepcionalmente, chegava com três horas de atraso.

Embora com a alma preenchida por ter ajudado quem necessitava de mim, entrei na avenida mais desconsolado do que satisfeito.
Ia, meio revoltado, a dizer com os meus botões: é sempre a mesma coisa… nunca me acontece nada de bom e só encontro pessoas para me ocuparem e maçar…

Nesse preciso momento encontro na minha frente, qual aparição celestial, uma figura ímpar, irrivalizável e inolvidável – uma miúda que me deixou completamente parado e sem reacção alguma, a não ser um arrepio que, como um choque eléctrico, percorreu todo meu corpo.

Devo ter ficado com uma cara de palerma, petrificado e sem esboçar um só gesto, como se o tempo e o mundo tivessem parado. A verdade é que eu senti algo de “físico”, muito além de um simples “ efeito emocional”.

Além de nunca ter acontecido (e jamais se repetiu) nada de semelhante na minha vida, foi uma sensação absurdamente estranha mas, julgava eu, fugaz e passageira.

Seguramente ela nem me viu. Contudo, esse momento ficou gravado a fogo no mais profundo do meu peito.

Ela prosseguiu o seu caminho com toda a normalidade. Eu, depois de recomposto do choque, lá fui ao encontro da turma.  


A história podia, e devia, ter terminado aqui, ou seja, nessa tarde de Junho do já longínquo ano 198x. Porém, feliz ou infelizmente (não tenho a certeza), não acabou.
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sábado, 20 de junho de 2020

Proposição: O que pretendo fazer… e porquê?

Caro blog:
Aproxima-se um dia muito importante para mim.

Vivemos numa espécie de turbilhão capitalista que suporta um mundo cada vez mais impessoal, desumano e de um atroz materialismo extremista. 

Falar de sentimentos já é considerado algo de retrogrado e anacrónico. A própria linguagem alterou-se de forma a tornar tudo formal e frígido – em vez de namorar ou amar alguém, fica-se por “ter uma relação” (ou seja, uma simples ligação ou conexão com algum interesse). 

 Neste tipo de sociedade “turbo-capitalista”, a avidez do dinheiro, do comércio e do lucro fácil suplantam e substituem os afectos, o amor, a generosidade das almas apaixonadas, por um conjunto de praxes artificiais de cariz comercial. As pessoas perderam o direito de sonhar e idealizar uma vida preenchida e feliz. 
Em vez disso, recebem projectos de vida parametrizados por interesses, artificializados pelo marketing e vendidos como “ideais” pelas “fábricas de sonhos” de produção em série, que são os “mass media”.

Tenho o desprazer de viver num tempo em que vejo cair a “normalidade social e humana”, assistindo à derrocada da sociedade para se tornar, apenas, numa comunidade. 
Perdemos o sentido comunitário em detrimento do “espírito de rebanho” – seguidistas cegos, narcísicos, egoístas e hipócritas, mas desprovidos de uma fraternidade irmanada na comunhão humana de bons e maus momentos, como amparo nas debilidades e sofrimentos, tanto quanto no festejo dos êxitos e vitórias. 

 Exactamente por isso é cada vez mais difícil gerir os conflitos. 
Ao mínimo desaire reina a lei da selva – cada um por si – o “outro” não conta, se não for uma fonte de prazer e realização para mim. Não me revejo neste tipo de “sociedade”. 

 Remando em contramaré, narrarei aqui, de forma sucinta, uma parte da minha verdadeira “História de Vida”.  
Vou iniciar o relato de factos reais, nos quais sou  personagem activa, de uma história de amor puro, intemporal e incondicional

Esta história envolve pessoas de carne e osso, factos objectivos e reais, quer em circunstâncias, quer no tempo. 

Perguntarás agora, meu caro blog:
“Por que razão vais fazer isso?

Olha!... Porque é algo que me atormenta há muitos anos.
Tem altos e baixos, mas continua como uma ferida que dilacera o peito.
Estou certo que não consigo esquecer, mas… quiçá isto ajude a viver com  algo que faz parte da minha existência. 

Atenção:
As "postagens" que se seguirão narram factos verdadeiros. Os lugares e alguns nomes próprios são igualmente verdadeiros. Mesmo assim, tudo farei para preservar o anonimato dos envolvidos, tentando evitar a identificação de lugares e pessoas. Se algum dos visados se achar ofendido, prejudicado ou incomodado, por favor contacte o autor (pelo e-mail: tristemente.sou@gmail.com), a fim reparar a situação (o que será feito de imediato e sem quaisquer hesitação).

quinta-feira, 11 de junho de 2020

Doente ou assustado...

Caro blog:

Tenho estado doente. 

Não, não é Covid, mas não tenho apetência para escrevinhar seja o que for. 

Aliás, aquilo que gostava de fazer pode ser perigoso. Começo a ter receio de escrever porque a minha história de vida envolve pessoas e isso pode ser arriscado. 
Fico indeciso.

Estou de quarentena na escrita e também na leitura. Aliás, prefiro não ler nada. Estamos passar por um momento de maluqueira universal, onde se atingem extremos inimagináveis. 

Julgo que estamos a entrar em caminhos perigosos e cujos resultados são incertos, mas podem evoluir para campos muitos perigosos. 

Parece que estamos a repetir os tristes e fatídicos acontecimentos da primeira metade do século XX. Temo que isso aconteça em todos os campos, nomeadamente no fervilhar de ideias indesejáveis, mas que, na conjuntura em que surgem, parecem muito inovadoras e justas. Foi assim que, na primeira metade do século passado, nasceram os regimes hediondos, cujos repugnantes princípios  e sórdida conduta dizimaram a Europa, nesse então.  

A minha ligação ao teatro levou a que veja em tudo um lado diferente. Não raras vezes transformo, inconscientemente, situações incomuns em episódios cómicos. É normal começar a rir de algo, sozinho e sem um detonador externo que não seja a forma como eu vejo as coisas.

Nos últimos tempos comecei a ver que esse facto pode colocar-me em grave risco. 
Esta semana passei o meu estado de alerta do grau de “apreensivo” para “assustado”.  

Vê só isto, meu caro blog:

Como ando a estudar alemão, entretenho-me a ler, quando posso, um ou outro blog nesse idioma. Estava num blog da Suíça, com todas as dificuldades de um iniciante da língua germânica, quando me deparo com esta frase - “Auch auslachen fällt bereits unter Mobbing.” 

Parei, porque imaginei que, mais uma vez, não era capaz de traduzir. Achava impossível aquilo que eu estava a traduzir (traduzia assim: «“Rir de” também já cai dentro do bullying.»…. Mobbing também pode ser traduzido como “assédio moral”). 

Usei o tradutor e, para surpresa minha, eu estava certo. Tenho de deixar de andar na rua, ou baixar a cabeça e andar de olhos fixos no chão. Corro o risco de me tornar um criminoso, acusado de um ilícito que eu considero grave, mas que em mim é um acto involuntário – rir-me sempre que vejo algo ou algum comportamento que eu considero bizarro, dissonante, fracturante, desadequado, caricato ou inconsequente. 

Blog, vou contar-te um episódio que, embora seja um bocado asqueroso, levou-me a rir da situação e os visados a perceber e afastarem-se.  

Na altura do Natal, andava eu a fazer umas compras de “Menino Jesus” (como sou católico, para mim, quem dá prendas no Natal é o Menino Jesus e não o Pai Natal) – sim, porque cá em casa eu sou o que mais gosta de dar prendas e fazer surpresas – quando me deparei com um casalito de namorados muito modernos. Ele tinha três argolas metálicas, de tamanho razoavelmente grande, no septo nariz. 

O pobre moço estava constipado. Ora, os desajustados apêndices metálicos não lhe permitam assoar o nariz de forma correcta e, a curtos intervalos, formava-se um balão nas ditas argolas. 

Olhei para eles e parti-me a rir. Eles aperceberam-se e, incomodados, foram-se embora. 

O que eu não sabia é que estava a incorrer em ilícito criminal… (se fosse na Suíça, mas daqui a nada será aqui). 

Para dizer a verdade, nunca me senti com tão pouca liberdade.

Bom, meu caro blog, hoje fico por aqui…

(Vou tentar refazer a minha “história de vida” e publicá-la, com as devidas cautelas.)

domingo, 7 de junho de 2020

Hoje apetece-me estar triste...

Meu caro blog:

Hoje apetece-me estar triste.

Não sei bem dizer porquê. Estou melancólico, prostrado e abatido, quase em astenia geral (física e psicológica).

Estive assim o dia todo. Mentalmente sinto-me um zumbi.

Sinto o peito enclausurado, emparedado e comprimido.
Até há poucos instantes sentia-me como se estivesse no meio de um nevoeiro espesso e corrosivo, onde tudo me feria e incomodava. 

Liguei o PC, passei por um “local terapêutico” – tu, caro blog, sabes muito bem de que falo – e fiquei ali, parado, em silêncio, contrito e reflexivo.

Nasceu o sol, mas o peito continua dolorido, pesado, amargurado…
Sabes, blog!?... Apetece-me ficar assim… num estado quase etéreo, entre dormente e insensibilizado, como se metade de mim fosse um cadáver e outra metade quisesse suportar a vida do “eu todo”.


Para mim o mundo não presta. Se a vida perde o sabor, então… 

[O meu mais subido reconhecimento pela bondade de passarem por este blog, pelo sacrifico de lerem e pela generosidade de comentar. A vossa presença é como se entre o lixo que eu sou, nascesse uma flor!]

quinta-feira, 4 de junho de 2020

Se pudesse... evitava estes erros...

Companheiro blog:

Tenho estado ausente. 
Sabes!? A minha semana foi tortuosa. Na segunda-feira fiquei com dor de cabeça, olhos pesados, “falta de ar”, garganta irritada, etc.  
Pensei: lá vem o bicho que se escapou aos chineses.
Não disse nada a ninguém, a não ser às caixas o ibuprofeno e do paracetamol. Secretárias ajuramentadas, elas calaram-se e a coisa foi-se compondo.
Não era a dita cuja bicheza, nem podia ser, assim eu tenho sido diligente no açaime arreatado na tromba, pródigo na frequência e dose de desinfectante nas mãos, nada de partilhas, proximidades ou abusos e uma cautela imaculada com as distâncias e com os protocolos de descontaminação - sentenças que não ousei ferir, nem ao de leve, em tempo algum. 

Como vês, caro blog, hoje estou chato e obtuso. Mesmo assim vou retornar à questão do último Post: 

O que mudaria se pudesse regressar ao tempo da minha juventude e alterar o curso da minha vida?

A resposta é: quase tudo!

Sou a antítese daquilo que gostaria de ter sido. Sou o mais completo e ilustrativo exemplo de falência, ruína e colapso de “um projecto de vida humana”. 
Escandaliza-te, amigo blog, pois aqui ousarei dizer “cousas que de mor espanto não houveras visto, nem doutra guisa supor”. 
Vejamos cinco barbaridades fulcrais:

Primeiro - Deixava de estudar. 
Sim, abandonava a escola e não seguia um percurso académico. Aliás, se hoje fosse jovem faria o mesmo e, nenhum juiz ou autoridade de qualquer matiz inverteria tal decisão. 
Claro que isto inviabilizaria a minha profissão - matava dois coelhos com uma só cajadada. 

Segundo – Por nada e sob nenhum pretexto desistira da “divinal princesa” que encantou (ou enfeitiçou!) a minha existência. Fossem quais fossem as circunstâncias: de joelhos, rastejando, de pé, a cavalo, cantando, orando, sorrindo ou chorando… não cometeria os mesmos erros. Não deixaria que nada me impedisse de chegar até ela e fazer-lhe ver quanto ela é especial para mim.   
Claro que isso não significa que ela anuísse em alguma proximidade com este rude estafermo. O mais certo é que o repúdio fosse o desfecho. Contudo, eu conformava-me com a certeza de que não fui vítima cobarde dos meus erros mais primários. 
Hoje essa “divinal musa” é, ao mesmo tempo, mais etérea e mais terrena do que naquele tempo. Mais longe do que nunca e tão presente como sempre, sinto-a humana e frágil, mas muito superior a mim.   

Terceiro – não aceitava proximidade com algumas pessoas da minha esfera familiar (e amigos) e muito menos “caía nos seus esquemas”. Um dos meus grandes defeitos sempre foi confiar nas pessoas que me são próximas, seja amigos ou familiares, esperando deles aquilo que eles podem esperar de mim – honestidade, seriedade e lealdade. Seria incapaz de lhe fazer coisas que me fizeram. 

Quarto – recusava-me terminantemente a ocupar cargos e a pertencer a uma séria de organismo e instituições a que pertenci ao longo da vida. 

Quinto – teria aproveitado cada segundo do meu tempo de forma a “saborear a vida”, sem me preocupar com o futuro, com as consequências ou com as opiniões alheias. 
Esbanjei todas as hipóteses, desbaratei a minha vida, estraguei tudo, perdia a única oportunidade de “viver a vida” porque esta é a minha única e irrepetível existência.

Meu caro amigo blog, definitivamente fui um crápula para mim próprio.


Hoje fico por aqui… (mas talvez volte a este assunto!).