quinta-feira, 11 de junho de 2020

Doente ou assustado...

Caro blog:

Tenho estado doente. 

Não, não é Covid, mas não tenho apetência para escrevinhar seja o que for. 

Aliás, aquilo que gostava de fazer pode ser perigoso. Começo a ter receio de escrever porque a minha história de vida envolve pessoas e isso pode ser arriscado. 
Fico indeciso.

Estou de quarentena na escrita e também na leitura. Aliás, prefiro não ler nada. Estamos passar por um momento de maluqueira universal, onde se atingem extremos inimagináveis. 

Julgo que estamos a entrar em caminhos perigosos e cujos resultados são incertos, mas podem evoluir para campos muitos perigosos. 

Parece que estamos a repetir os tristes e fatídicos acontecimentos da primeira metade do século XX. Temo que isso aconteça em todos os campos, nomeadamente no fervilhar de ideias indesejáveis, mas que, na conjuntura em que surgem, parecem muito inovadoras e justas. Foi assim que, na primeira metade do século passado, nasceram os regimes hediondos, cujos repugnantes princípios  e sórdida conduta dizimaram a Europa, nesse então.  

A minha ligação ao teatro levou a que veja em tudo um lado diferente. Não raras vezes transformo, inconscientemente, situações incomuns em episódios cómicos. É normal começar a rir de algo, sozinho e sem um detonador externo que não seja a forma como eu vejo as coisas.

Nos últimos tempos comecei a ver que esse facto pode colocar-me em grave risco. 
Esta semana passei o meu estado de alerta do grau de “apreensivo” para “assustado”.  

Vê só isto, meu caro blog:

Como ando a estudar alemão, entretenho-me a ler, quando posso, um ou outro blog nesse idioma. Estava num blog da Suíça, com todas as dificuldades de um iniciante da língua germânica, quando me deparo com esta frase - “Auch auslachen fällt bereits unter Mobbing.” 

Parei, porque imaginei que, mais uma vez, não era capaz de traduzir. Achava impossível aquilo que eu estava a traduzir (traduzia assim: «“Rir de” também já cai dentro do bullying.»…. Mobbing também pode ser traduzido como “assédio moral”). 

Usei o tradutor e, para surpresa minha, eu estava certo. Tenho de deixar de andar na rua, ou baixar a cabeça e andar de olhos fixos no chão. Corro o risco de me tornar um criminoso, acusado de um ilícito que eu considero grave, mas que em mim é um acto involuntário – rir-me sempre que vejo algo ou algum comportamento que eu considero bizarro, dissonante, fracturante, desadequado, caricato ou inconsequente. 

Blog, vou contar-te um episódio que, embora seja um bocado asqueroso, levou-me a rir da situação e os visados a perceber e afastarem-se.  

Na altura do Natal, andava eu a fazer umas compras de “Menino Jesus” (como sou católico, para mim, quem dá prendas no Natal é o Menino Jesus e não o Pai Natal) – sim, porque cá em casa eu sou o que mais gosta de dar prendas e fazer surpresas – quando me deparei com um casalito de namorados muito modernos. Ele tinha três argolas metálicas, de tamanho razoavelmente grande, no septo nariz. 

O pobre moço estava constipado. Ora, os desajustados apêndices metálicos não lhe permitam assoar o nariz de forma correcta e, a curtos intervalos, formava-se um balão nas ditas argolas. 

Olhei para eles e parti-me a rir. Eles aperceberam-se e, incomodados, foram-se embora. 

O que eu não sabia é que estava a incorrer em ilícito criminal… (se fosse na Suíça, mas daqui a nada será aqui). 

Para dizer a verdade, nunca me senti com tão pouca liberdade.

Bom, meu caro blog, hoje fico por aqui…

(Vou tentar refazer a minha “história de vida” e publicá-la, com as devidas cautelas.)

4 comentários:

  1. Meu caro, se lhe serve de algum consolo, digo-lhe que também ando assustada e que me parece cada vez mais que a Humanidade está à beira da loucura colectiva.

    Bom final de semana

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    1. Muito obrigado pela sua visita a este meu cantinho de desabafos.
      Vejo o mundo assim: temos muito acesso a informação, mas cada vez mais falta capacidade de saber processar e filtrar essa informação. Ou seja, é fácil baralhar as pessoas e levá-las por caminhos perigosos. Se isto acontecia com os "lideres" que galvanizavam a multidão que os escutava, hoje o se parlatório é o mundo inteiro e a multidão é a Humanidade.
      Ou então, sou eu que estou a ficar velho!
      Obrigado, bem-haja e volte sempre.

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  2. Estamos rapidamente a entrar nos extremos, o que, pelo que a história nos conta, não dá bom resultado. Seremos nós, capazes de nos apercebermos e pararmos?! Infelizmente, não o creio. Assim, só lhe posso dar razão.

    Quanto ao que deixou no meu espaço, dou-lhe os parabéns! Louvo quem conseguiu, de imediato, aperceber-se do que era a grandiosidade d'Os Lusíadas. Não ter sido percepcionado da minha parte, não estranho, pois não gostava de letras e línguas. Estava vocacionada para artes e ciências (sem o saber) e acabei por fazer algumas disciplinas "passando por cima" de muita coisa. Contudo, o que acho importante é que, mais tarde, a percepção abriu-se para vários horizontes e, felizmente, não fiquei "cristalizada".

    Quanto ao que gosta de fazer. Compreendo a sua postura. Mas, qual é a história de vida que não se cruza com histórias de outras vidas? Afinal, somos seres sociais(pelo menos, por enquanto)!

    Bom fim de semana!

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  3. Já lá vão os tempos em que era um devorador de literatura! Nesse tempo gostava de "saborear" a leitura e Camões foi "sabor muito agradável".
    "In illo tempore", na minha terra natal passava uma "biblioteca itinerante" (Uma carrinha Citroen, financiada pela Fundação Caloust Gulbenkian) que emprestava livros para leitura domiciliária. Eu era um dos consumidores mais assíduos desse produto - isso era um acto de rebedia. Agora sou um inactivo, um preguiçoso...

    Sobre Camões, relembro-lhe o que ele disse de si próprio:

    «Mas eu que falo, humilde, baixo e rudo,
    De vós não conhecido nem sonhado?
    Da boca dos pequenos sei, contudo,
    Que o louvor sai às vezes acabado.
    Nem me falta na vida honesto estudo,
    Com longa experiência misturado,
    Nem engenho, que aqui vereis presente,
    Cousas que juntas se acham raramente.»



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